'Space Week Nordeste' fomenta o desenvolvimento regional com integração da indústria, pesquisa e cultura Aeroespacial no NE
- Pernambuco Transparente
- 24 de set.
- 9 min de leitura
Atualizado: 26 de set.
Como uma cientista política encantada pela cultura aeroespacial, foi um deslumbre prestigiar o encerramento da Space Week Nordeste no Shopping RioMar Recife, concluindo uma vasta programação prévia no Cais do Sertão. Em sua 3ª edição (após ser sediada em Fortaleza e São Luís em 2023 e 2024), a Semana, que é um evento exclusivo da região, já representa um evento de imensa importância estratégica e simbólica. Longe de ser apenas uma convenção para entusiastas, ela é a prova viva de que a visão do Nordeste como um mero polo de serviços ou turismo está em profunda transformação. A semana dedicada ao espaço é um catalisador que reúne a comunidade científica, o setor privado e o poder público, demonstrando o potencial da região para se tornar um hub de alta tecnologia e uma peça-chave no cenário aeroespacial brasileiro e global.
O evento serve como uma vitrine para a capacidade de inovação da região. Universidades, centros de pesquisa e startups nordestinas, antes pouco visíveis, agora têm um palco para exibir seus projetos em áreas como engenharia de satélites, propulsão, e análise de dados espaciais. Uma conjunção fascinante, pois mostra como a agenda de desenvolvimento de uma região pode ser redefinida pela confluência de investimento em capital humano e tecnologia de ponta. É a democratização do acesso a uma indústria que, por muito tempo, foi vista como exclusiva de poucas nações desenvolvidas.
No século XXI, o Nordeste brasileiro emerge como uma fronteira estratégica para a indústria aeroespacial impulsionado por um privilégio geográfico inigualável. A proximidade da região com a linha do Equador permite que os centros de lançamento aproveitem a velocidade de rotação da Terra (entenda melhor essa dinâmica aqui), reduzindo significativamente o consumo de combustível e aumentando a capacidade de carga dos foguetes. Essa vantagem econômica tem atraído investimentos federais e internacionais, consolidando o potencial da região para se tornar um hub tecnológico e uma plataforma mundial para lançamentos espaciais. Confira um resumo e 'fique por dentro' dos empreendimentos de relevo em cada estado:
Maranhão: O estado se destaca pelo Centro de Lançamento de Alcântara (CLA), um dos locais mais estratégicos do mundo para lançamentos de foguetes. Retomado para fins comerciais recentemente, os retornos de investimentos federais e de parcerias internacionais irão modernizar a infraestrutura para viabilizar operações comerciais de veículos lançadores. Em 2025, a empresa sul-coreana Innospace recebeu autorização da Agência Espacial Brasileira (AEB) para realizar o primeiro lançamento comercial. Possui uma Sociedade de Astronomia que atua na frente da divulgação científica, a SAMA.
Rio Grande do Norte: O estado conta com o Centro de Lançamento da Barreira do Inferno (CLBI), que, embora seja mais focado em foguetes de sondagem (ou seja, um perfil diferente de Alcântara), recebe recursos para modernização e apoio a pesquisas científicas e tecnológicas. O Governo do RN também aposta no setor aeroespacial com um projeto especial, o 'Constelação Potiguar': uma constelação de nanossatélites (para monitorar diversas áreas estratégicas de políticas públicas, desde o gerenciamento costeiro, à segurança pública) liderada pelo Parque Científico e Tecnológico Augusto Severo (PAX-RN) em parceria com a Agência Espacial Brasileira e distintas instituições científicas do estado.
O RN é o estado mais notório no avanço de projetos voltados para o incentivo de jovens: uma verdadeira lista, começando pelo 'Meninas no Espaço' e o 'Ciência para Todos' (com 15 anos), seguindo com o Centro Vocacional Tecnológico Espacial – Parnamirim (CVT-E), da AEB, que promove uma gama de atividades em inúmeros municípios, enquanto o 'Caravana do Espaço', composto por estudantes, professores e pesquisadores da UFRN, percorre cidades do interior nordestino popularizando o conhecimento aeroespacial - esses dois são esclarecidos mais adiante, neste texto. Abaixo, um depoimento de dois alunos participantes do CVT-E:
Estudantes do CVT-E validam a importância do programa de vocação em suas trajetórias pessoais Pernambuco: O estado investe em pesquisa, tecnologia e formação de talentos por meio do Porto Digital (principal distrito de inovação da América Latina há mais de 24 anos) e universidades, com foco em software, sensoriamento remoto e análise de dados espaciais. A estratégia também se baseia na inovação e na construção de um ecossistema. Ademais, a Base Aérea do Recife é a sede do controle de tráfego aéreo do Nordeste, e o estado possui tradição na formação de pilotos, com escolas desde 1940 pelo Aeroclube.
O campo acadêmico dispõe os proeminentes grupos de pesquisas na UFPE 'Asa Branca Aeroespace' (agregando diversos estudantes e professores de vários cursos) e o 'AstroLegis' (voltado para o Direito aeroespacial) - além de um movimento de incentivo à cultura científica mais consolidado na Região, tanto no consagrado Espaço Ciência (em reforma para ampliação e reabrir seu planetário), como de maneira difusa pela Sociedade Astronômica do Recife, com mais de 50 anos de existência e que leva equipamentos até para shoppings da região metropolitana. No interior, há projetos como o Astro Agreste, fundado em 2017.
Ceará: Com a previsão do novo campus do Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), o estado se posiciona para atrair investimentos em pesquisa e desenvolvimento, formando um polo de excelência em engenharia aeroespacial e aeronáutica. A entrega da primeira etapa já está prevista para 2026, com a primeira turma em aulas temporariamente em São José dos Campos. O estado conquistou a sede por mérito dos cearenses, que geralmente ocupavam quase metade das vagas no vestibular do ITA e estrategicamente, direcionará sua formação para demandas regionais.

Campus ITA em Fortaleza: Século XXI eleva o Nordeste a centro Aeroespacial do Brasil Bahia: Foi inaugurado em julho de 2025, na Base Aérea de Salvador, o Parque Industrial e Tecnológico Aeroespacial da Bahia (PITA-BA). O objetivo é promover o desenvolvimento nacional do setor de aeronáutica, com avanços em pesquisa, ciência, educação e tecnologia. Aposta na manutenção e reparo de aeronaves (MRO), buscando consolidar sua infraestrutura aeroportuária para atrair empresas do setor. Há ainda projetos de pesquisa em universidades, e em escolas, como o 'Hack At Schools'.
Paraíba: Em breve, o estado será um polo da Astronomia no Brasil. O Governo Estadual, através de sua Secretaria de Ciência e Tecnologia, iniciou a construção da 'Cidade da Astronomia' - um imenso centro de R$ 24 milhões no município de Carrapateira, no Sertão paraibano. O espaço reunirá observatórios, planetário, instalações educativas e experiências interativas, promovendo educação científica e turismo astronômico para diversos públicos.
O projeto integrará o atual Complexo Científico do Sertão, um conjunto de iniciativas voltadas ao fomento das pesquisas nas áreas de astronomia, paleontologia e arqueologia. Além da Cidade, o Complexo contempla outros equipamentos, como o radiotelescópio BINGO (o maior radiotelescópio da América Latina), em Aguiar (carro-chefe do projeto, com alcance internacional); o Museu de Arqueologia, em Cajazeiras e o Monumento Parque Vale dos Dinossauros, em Sousa.
Atualmente, o Governo também desenvolve o maravilhoso projeto 'Esperança no Espaço', demonstrando como a ciência, a tecnologia e a educação podem mudar vidas ao construir telescópios com reeducandos da Cadeia Pública de Esperança-PB, sendo considerado um modelo de sucesso em ressocialização e popularização da ciência. Mais de 600 unidades serão distribuídas nas escolas, com capacitação de professores e estudantes. Em depoimento, o Prof. Jamilton Rodrigues, da UEPB, explica detalhes:
Alagoas, Piauí e Sergipe: Esses estados concentram seus esforços em iniciativas acadêmicas, com grupos de pesquisa e de divulgação científica e laboratórios em universidades federais que desenvolvem projetos de menor escala em áreas como propulsão, estruturas e sistemas embarcados, com investimentos mais voltados para a pesquisa e o desenvolvimento de capital humano. [Caso haja algum de infraestrutura como nos demais em curso, entre em contato para correção da matéria]!
A Space Week Nordeste é, portanto, fundamental para o fortalecimento do ecossistema local, que já possui uma Federação Aeroespacial, a FAERNE. Ela cria um ambiente propício para a formação de parcerias estratégicas entre a academia e empresas, além de conectar talentos locais a oportunidades de emprego e pesquisa. A presença de representantes de agências espaciais e de grandes empresas do setor estimula a confiança, contribuindo para alimentar novos investimentos e consolidar um ciclo virtuoso que beneficia a todos. É a evidência de que, para inovar, não é preciso estar no Vale do Silício, ou em Houston, no Texas (sede da Nasa) mas sim ter um ecossistema conectado e um propósito claro.
Além dos aspectos técnicos e econômicos, a Space Week possui um impacto social profundo. Ao inspirar jovens estudantes e profissionais a sonhar com carreiras em ciência, tecnologia e engenharia, ela atua diretamente no combate à evasão escolar e na redução das desigualdades educacionais. O espaço, que antes era uma abstração distante, torna-se uma aspiração tangível, um futuro possível para a juventude nordestina. Esse "efeito-inspiração" é um dos maiores ativos da semana e um elemento crucial para o desenvolvimento da região.

Afora seus cursos gratuitos virtuais ('Escola Virtual AEB'), os programas educacionais da Agência Espacial Brasileira já alcançam as dezenas de milhares de estudantes e em muitos municípios, em parcerias com as redes públicas de ensino. Inclusive, a transmissão de conhecimentos sobre o universo aeroespacial para jovens é uma realidade há quase uma década no Rio Grande do Norte: o Centro Vocacional Tecnológico Espacial – Parnamirim (CVT-E), é voltado para atividades tecnológicas e educacionais orientadas pela Diretoria de Satélites, Aplicações e Desenvolvimento da AEB, com foco na difusão do acesso ao conhecimento científico e na transferência de conhecimentos tecnológicos na área espacial. O CVT-Espacial foi implementado em parceria com o Centro de Lançamento da Barreira do Inferno (CLBI), em Natal.
Além do aprendizado voltado para crianças e adolescentes, o Centro tem estrutura para capacitar pessoal técnico, facilitar a inserção social e qualificar professores, universitários e outros profissionais nos temas relacionados com as atividades espaciais. Uma apresentação dessa trajetória ao longo dos últimos anos foi realizada pela coordenadora do programa e servidora concursada da AEB, Adriana Corrêa (fotos abaixo):
Em suma, a Space Week Nordeste é mais que um evento e uma ocasião extraordinária para prestação de contas das políticas aeroespaciais dos nossos governos: é uma declaração de intenções. Ela simboliza a audácia e a ambição de uma região que entende que o embarque na era da transformação digital e da inovação não é apenas sobre aplicativos e plataformas, mas sobre a capacidade de construir uma indústria do zero, de olhar para o céu e enxergar não apenas estrelas, mas um futuro de desenvolvimento, inclusão e prosperidade.
E essa evolução não poderia se encerrar em uma semana inteira de eventos. Ela se estende e se aprofunda através de iniciativas contínuas como o 'Projeto Caravana Espacial', que leva a ciência e a inspiração da agenda aeroespacial para além das capitais, alcançando o interior e as comunidades mais remotas do Nordeste. É nesse movimento que essa agenda se traduz em um progresso coletivo, garantindo que esse olhar seja uma aspiração real para todos. Afinal, a construção de um futuro de desenvolvimento, inclusão e prosperidade é um processo ininterrupto, e são iniciativas como essa que têm demonstrado o compromisso regional em novas rotas.
Coordenado pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) em colaboração com o IFRN, o projeto utiliza um laboratório sobre rodas para despertar o interesse da população, especialmente em municípios do interior. Além disso, contam com a parceria do Centro Vocacional Tecnológico Espacial (CTV-E/AEB), dos principais Centros de Lançamento de Foguetes e de instituições acadêmicas que compõem uma rede integrada, a Rede Nordeste Aeroespacial (um programa de pós-graduação colaborativo que reúne a Universidade Estadual do Maranhão/UEMA, a Universidade Federal do Maranhão/UFMA, a Universidade Federal de Pernambuco/UFPE e a Universidade Federal do Rio Grande do Norte/UFRN).
Assim, é um projeto de divulgação científica itinerante, que busca tornar o conhecimento científico aeroespacial acessível, sobretudo em lugares carentes da infraestrutura necessária para este intuito (como laboratórios, observatórios, museus, entre outros) - levando equipamentos modernos e palestrantes com vasto conhecimento na temática aeroespacial aos rincões do Nordeste. Nos dois anos de financiamento, a partir da Chamada 36/2022 do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), o projeto esteve em cerca de 40 escolas, atendeu mais de 30 municípios e impactou milhares de pessoas distribuídas pelos estados do Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco, Ceará e Maranhão.

Por fim, para os interessados no planejamento de políticas, a AEB abriu prazo para receber propostas de missões espaciais para análise até o dia 20 de outubro, e o maior 'hackathon' do planeta, o 'NASA Space Apps Challenge', sucederá nos próximos dias a programação da Space Week Nordeste. A competição vai além da simples celebração da ciência. Ao abrir o imenso acervo de dados públicos da NASA para cidadãos comuns em uma maratona de uso de dados abertos, a iniciativa transforma a tecnologia de um campo restrito a agências governamentais em uma plataforma para a participação cívica global. É a legitimação de que o conhecimento, quando compartilhado e incentivado, pode gerar soluções criativas e de baixo custo para desafios complexos, combatendo a centralização da inovação e fomentando um ecossistema de colaboração sem fronteiras.
No ano de 2025, será realizado em diversas capitais do Nordeste (Recife, Fortaleza, João Pessoa, Maceió, Salvador e São Luís), fortalecendo a presença da região na agenda global de inovação. Na edição de 2024, uma equipe de Alagoas foi finalista da maratona.

*Texto por Raquel Lins. Criadora do Nordeste Transparente, é Bacharel em Ciência Política com ênfase em Relações Internacionais pela Universidade Federal de Pernambuco. É especialista em Planejamento e Gestão Pública pela Universidade de Pernambuco e possui MBA em Auditoria e Inovação no Setor Público pela FEA-USP/IRB (2024). Atua em temas relacionados à promoção da transparência e integridade governamental, governo aberto, controle e inovação em políticas públicas - tendo desenvolvido experiência prática ao longo de uma década através da criação do projeto pioneiro Pernambuco Transparente em 2018, visando estimular a compreensão do assunto pela sociedade, e como um de seus resultados, lançado o portal Dados Abertos Pernambuco, plataforma com amplo acervo didático sobre o universo da abertura de dados e reconhecida com voto de aplauso pela Câmara Municipal do Recife.
[+ Currículo Lattes]
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